21 de janeiro de 2008

A PONTE

A ponte
(Franz Kafka)

Eu era rígido e frio, eu era uma ponte; estendido sobre um precipício eu estava. Aquém estavam as pontas dos pés, além, as mãos, encravadas; no lodo quebradiço mordi, firmando-me. As pontas da minha casaca ondeavam aos meus lados. No fundo rumorejava o gelado arroio das trutas. Nenhum turista se extraviava até estas alturas intrasitáveis, a ponte não figurava ainda nos mapas. Assim jazia eu e esperava; devia esperar. Nenhuma ponte que tenha sido construída alguma vez, pode deixar de ser ponte sem destruir-me.
Foi certa vez, para o entardecer - se foi o primeiro, se foi o milésimo, não o sei - meus pensamentos andavam sempre confusos, giravam, sempre em círculo. Para o entardecer, no verão, obscuramente murmurava o arroio, quando ouvi o passo de um homem. A mim, a mim. Estira-te, ponte, coloca-te em posição, viga órfã de balaústres, sustém aquele que te foi confiado. Nivela imperceptivelmente a incerteza de seu passo, mas se cambaleia, dá-te a conhecer e, como um deus da montanha, atira-o à terra firme.
Veio, golpeou-me com a ponta férrea de seu bastão, depois ergueu com ela as pontas de minha casaca e arrumou-as sôbre mim. Com a ponta andou entre meu cabelo emaranhado e a deixou longo tempo ali dentro, olhando provavelmente com olhos selvagens ao seu redor. Mas então - quando eu sonhava atrás dele sobre montanhas e vales - saltou, caindo com ambos os pés na metade de meu corpo. Estremeci-me em meio da dor selvagem, ignorante de tudo o mais. Quem era? Uma criança? Um sonho? Um assaltante de estrada? Um suicida? Um tentador? Um destruidor? E voltei-me para vê-lo. A ponta de volta! Não me voltara ainda, e já me precipitava, precipitava-me e já estava dilacerado e varado nos pontiagudos calhaus que sempre me tinham olhado tão aprazivelmente da água veloz.
foto de Guto Horta

18 de janeiro de 2008

A EXTREMA UTILIDADE DO POLITEÍSMO




Que cada indivíduo possa criar seu próprio ideal para dele inferir sua lei, seus prazeres e seus direitos, é o que foi considerado, acredito, até agora como a mais monstruosa de todas as aberrações humanas, como a idolatria por excelência;...Foi numa arte maravilhosa, na força de criar deuses – o politeísmo – que esse instinto pôde se descarregar, se purificar, se aperfeiçoar, se enobrecer, pois primitivamente esse era um instinto vulgar, mediócre, parente da teimosia, da desobediência e da inveja. Combater esse instinto de um ideal pessoal foi antigamente o mandamento de toda a moralidade.
... Foram inventados deuses, heróis, super-homens de todas as espécies, assim como quase homens e sub-homens, anões, fadas, centauros,sátiros, demônios e diabos para justificar o egoísmo e glorificar o indivíduo: a liberdade que se concedia a um deus com relação a outros deuses acabou por ser conferida a si próprio com relação às leis, aos costumes e aos vizinhos. O monoteísmo, pelo contrário, essa rígida consequência da doutrina de um homem normal – portanto, a fé num deus normal junto do qual não há senão deuses falsos – foi talvez até agora o maior perigo da humanidade...
No politeísmo se encontrava uma primeira imagem do livre pensamento e do pensamento múltiplo do homem; a força de se criar olhos novos e pessoais, olhos sempre mais novos e sempre mais pessoais, de modo que, só para o homem, entre todos os animais, não há horizontes e perspectivas eternas.
Friedrich Nietzsche

14 de janeiro de 2008

ESCURO ILUMINADO

Escuro dramático,... arrepios..., sobressaltos.
Escuto um assobio estranho, vejo vultos, sombras,
... sapos, corujas, jacarés, ratos, cobras...pistas de pouso, estrelas cadentes,
... medo.
Então surge a luz... quebrando o encanto,
clarificando a magia,
... me fazendo de tola e covarde diante de mim mesma.
Que absurdo!!!
... enquanto a escuridão materializa minha pior parte, a luz revela e expõe minha pior parte...
Sentirei medo ou vergonha...?
Me manterei no limbo, na sombra do meu ser,
ou no céu, luminosidade ofuscante da minha cegueira?

09/01/08 Cris Rangel

1 de janeiro de 2008

ADEUS 2007

2007... já passou..., devo dizer adeus, mas ...,
desafios vencidos, medos confrontados,sensações despertadas,
limites transpostos. Fui parar no outro lado da moeda..., atravessei pontes,
fiz travessias longas e sempre voltei...
Constatações:
- A humanidade é um corpo só, portanto não adianta eu entrar em conflito com meu pé, meu cérebro, meu estômago,... coração.
- Corpo-Homem dentro do Corpo-Terra dentro do Corpo-Universo, que é o Corpo-Deus.
Liberdade total, uma linda quimera..!
- Sempre consigo aquilo que desejo, o problema é lidar com o que desejo,
as vezes é o inferno!
- Passo,passo,...calma...,observa o passo, a trilha, a estrada... Atenção, ... escolhe!
- Faço o que tenho de fazer, não delego mais minhas responsabilidades a outros.
- Projetos: fazer, refazer, criar, sintetizar,moldar, transformar, ... forma ideal?
Sem expectativas ilusórias, por favor.
-Auto-consciência da auto-reflexão.
Conseguir se enxergar...aonde? No espelho, na imagem? No outro?
Mas não me reconheço, essa não sou eu, eu não sou desse jeito!
( e o outro continua me refletindo... por isso às vezes não tolero as pessoas...
mas preciso auto-refletir , isso me redireciona, preciso do outro!)
Então adeus 2007...
Bem vindo 2008...
Consolidar o que foi construído, só que de uma maneira nova...
desafio!!! Isso vai ser muito divertido!
O Louco dará seu primeiro passo... de novo... só que auto-consciente e auto-reflexivo.
Um louco sábio...!
Boa sorte e que venha 2008!!!